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Diogo Marques dos Santos

quinta-feira, 21 de abril de 2011

À conversa com... Eliane Ubillús (Parte II)

Dando continuaçao ao post anterior, eis a segunda parte da entrevista com Eliane Ubillús. 


BdP -  Quando organizamos eventos, e por mais que eles sejam bem preparados, que o são, existem sempre algumas coisas que fogem do nosso controlo. Tem algum momento mais caricato que gostasse de partilhar com os nossos leitores?

EU - Vou transcrever dois trechos do meu livro “Cerimonial – Fatos Fotos e Sucesso no Município”[1] – Cultura Acadêmica Editora – 2009 – pag. 340

Perdeu-se um Embaixador !!! 

O professor Marcílio Reinaux, na ocasião Presidente do CNCP, solicitou-nos que a 14ª Reunião de Colegiado do CNCP fosse realizada em Campos do Jordão.
Depois da autorização do Prefeito João Paulo Ismael, iniciamos os preparativos.
Tudo foi previsto nos mínimos detalhes. Patrocinadores, hotel, traslados, presentes, flores e passeios foram detalhadamente vistos e revistos.

Toda a equipe do cerimonial estava preparada e recomendações não faltaram. Chegamos mesmo a fazer um novo treinamento no Aeroporto de Guarulhos para que tanto a assessoria do cerimonial como os motoristas desempenhassem o trabalho do receptivo com perfeição, afinal era “uma prova de fogo”, pois estaríamos recebendo “a nata do cerimonial brasileiro”.

A colaboração de todos foi dentro de muito entusiasmo e, afinal, chegou o grande dia!

Equipes de receptivo a postos nos Aeroportos de Guarulhos e de São José dos Campos. Seriam dois dias recebendo os participantes.

No primeiro dia tudo perfeito. Pessoal uniformizado e usando crachá; Planilha de chegada na mão auxiliando a conferir números de vôos, horários e nome de quem estava desembarcando. Telefonemas para a Prefeitura de Campos do Jordão nos informavam sobre o andamento do trabalho. Foi tudo fácil. Davam as boas vindas aos recém chegados que em seguida eram embarcados nos carros pré-estabelecidos. O pequeno atraso de um dos vôos foi administrado com tranqüilidade.

Em Campos do Jordão, nosso trabalho ia muito bem. Kits de presentes nos apartamentos, sala montada, enfim, tudo sob controle.
Ao chegarem, nossos colegas faziam os maiores elogios à equipe do cerimonial, o que nos orgulhava sobremaneira. A noite era de alegrias e expectativas de que, aquela, seria uma excelente reunião.

No dia seguinte, o receptivo teria apenas uma assistente, a Marcela, que na véspera havia sido muito elogiada por seu trabalho.

Lá se foram pela manhã, bem cedinho, a nossa Marcela e o motorista José Carlos. O aguardado era o Embaixador Augusto Estellita Lins, que chegaria de Brasília num vôo doméstico da Vasp.

Tudo confirmado, mas o Embaixador não desembarcou. Com certa apreensão, nossa assistente procurou o balcão de informações da Vasp onde recebeu a confirmação de que ele realmente estaria naquele vôo. Apesar de não conhecê-lo pessoalmente, Marcela havia visto fotos do Embaixador e, sobretudo, estava com a plaquinha de receptivo. O tempo foi passando e ela já muito nervosa, nos avisou sobre o acontecido. Confiávamos nela e a deixamos resolver a questão sem interferências. Depois de muita insistência junto a Vasp, Marcela descobriu, imaginem!...a bagagem do Embaixador!

Aí foi desvendado o mistério: Na hora do embarque o Embaixador Estellita foi transferido para um vôo Internacional da Varig, mas sua bagagem veio pela Vasp. No aeroporto de Guarulhos, os vôos domésticos, de acordo com a companhia aérea, têm o desembarque no terminal 1 ou 2 mas os vôos internacionais igualmente têm dois desembarques. O da Varig era no 2, muito distante daquele que seria o doméstico da Vasp, já que o vôo chegava de Brasília...

O “esperado”, ao desembarcar, além de não encontrar sua mala, também não encontrou o nosso receptivo. Foi à Varig e lhe disseram que a bagagem deveria estar na Vasp. Foi à Vasp e não estava. Comentou com os funcionários da Vasp que ia pegar um táxi, porque não havia encontrado ninguém de Campos do Jordão, e que a Vasp mandasse sua bagagem para o destino final, pois era responsabilidade da empresa.

Minutos depois, Marcela chega a este departamento da Vasp tentando alguma resposta para o “sumiço” e lhe dizem que o Embaixador acabara de sair, e que sua mala, acabara de chegar. Ela, muito esperta, pediu que lhe entregassem a bagagem, o que foi aceito pela Vasp, porque as histórias tanto dele como dela se encaixavam perfeitamente.

O motorista e a Marcela “zarparam” para Campos do Jordão em meio à angústia e apreensão por não haver recebido o convidado, mas no meio do caminho têm a idéia de ligar para o Portal de Campos do Jordão e solicitar à guarda municipal que interceptasse o táxi do aeroporto (é fácil porque tem legenda no veículo) e pedisse ao Embaixador para aguardar, porque eles chegariam em seguida, inclusive, com sua bagagem.

O táxi foi interceptado, e a nossa assessora, exemplarmente, chegou ao Hotel Mont Blanc, onde estávamos reunidos, junto com o Embaixador Augusto Estellita Lins.

Mais tarde ela nos dizia que durante todo o tempo pensava... –“Se eu não chegar lá com esse embaixador, a minha chefe me mata”!

Durante o evento, ao comprar o livro do Embaixador, Marcela foi brindada com a seguinte dedicatória:

À colega e amiga cerimonialista Marcela Pereira da Cunha, com meus agradecimentos por sua gentileza e pela magnífica acolhida nesta linda cidade onde entrei triunfalmente após uma corrida emocionante onde não faltaram cenas de 007.

Com meu abraço mais afetuoso,

Augusto Estellita Lins

Campos do Jordão 4 / 2 /1996.

O fato desperta para o fato do quão importante é a comunicação. Nos dias de hoje, em que quase todos têm celulares, bastaria um telefonema do Embaixador antes de sair de Brasília ou mesmo ao desembarcar em São Paulo, para evitar o transtorno. Todos seriam poupados desta intranquilidade e o “aguardado” seria mais bem atendido.

Por outro lado, a história além de ilustrar este livro, serviu para que a amizade entre nós e o Embaixador, aumentasse ainda mais.


Pag. 77

Eu sou Ministra!!!

Teríamos a presença de uma Ministra de Estado numa reunião do CODIVAP. O programa contemplava duas palestras; a primeira seria a dela, seguida de perguntas dos prefeitos e a segunda do Secretário de Estado que também teria perguntas posteriores.

Na maioria das vezes, temos que adequar o programa aos horários de retorno das autoridades em função da decolagem dos aviões e helicópteros. Desta vez não foi diferente. A ministra teria que se ausentar no meio da reunião e por esta razão a colocamos como primeira palestrante, ainda que soubéssemos, sem nenhuma dúvida, que sua precedência é superior a de um Secretário de Estado.

Nossa surpresa foi grande ao sermos chamados por aquela autoridade que nos disse:

“Eu não vou falar antes de um secretário de estado. Eu sou ministra, portanto falo depois. Que cerimonial é esse?”

Tentando explicar a situação, lhe respondi que havíamos decidido aquela ordem não em função da precedência, (não se tratava de pronunciamentos e sim de palestra), mas sim para atender à solicitação de sua assessoria que havia comunicado que a ministra sairia no meio da reunião para atender à hora da decolagem do avião.

A resposta da ministra foi:

“Quem entende de cerimonial sabe que eu não falo antes de um secretário por isso anuncie o secretário.”

Imediatamente comunicamos ao Presidente do CODIVAP (que havia escutado nossa conversa), e ao secretário de estado, sobre a inversão no programa e indagamos se ele aceitaria falar em seguida. O secretário, muito gentil, respondeu: “Estou aqui para colaborar. Somos parceiros. Farei o que for necessário”.

Assim foi. Anunciamos o secretário de estado que em seguida começou a sua palestra. Sabíamos que atrasaria em muito a hora de saída da ministra, mas foi ela quem decidiu.

Com o passar do tempo, lembramos o Presidente sobre a necessidade de solicitarmos aos prefeitos que as perguntas fossem feitas após a saída da ministra, pois o tempo era escasso.

 Ele, por sua vez, logo depois da palestra do secretário pediu aos prefeitos a gentileza de que deixassem para fazer as perguntas posteriormente, em virtude do adiantado da hora, o que foi prontamente atendido.

A ministra passou a ser anunciada e em seguida à palestra respondeu sobre dúvidas e colocações dos prefeitos.

Durante este período, levamos ao conhecimento de sua assessoria o acontecido. A equipe, admiravelmente ética e gentil, ficou surpresa com a postura daquela autoridade.

Na verdade, a única chance de se respeitar a hora de saída da ministra era anunciá-la primeiro. Assim havia sido decidido e deveria ter acontecido para que tudo desse certo.

Acabou que, com a fala do secretário em primeiro lugar, a reunião ficou desorganizada porque após a saída da ministra é que voltamos ao primeiro assunto.

Certas pessoas, por vaidade ou desconhecimento da razão pela qual as coisas são decididas, fazem uma verdadeira revolução no que deveria ser passivo.
Nessa vida, tudo tem uma razão. O programa contemplava o pronunciamento da ministra, a comunicação bilateral junto aos prefeitos e as despedidas para, após sua ausência, acontecer a do secretário.

Por excesso de zelo quanto à sua precedência, ela acabou tendo que dividir o “brilho” com a outra autoridade. Apenas por desconhecer o “porque das coisas”.
Tudo havia sido planejado para que só ela brilhasse no momento em que estivesse junto a nós. Lamentavelmente isso não aconteceu e o pior é que deixou a quem estava na organização completamente insatisfeito com aquela imagem arrogante.

Na saída, mudou o “tom”, e ao se despedir nos disse: “Desculpe pela trapalhada que eu fiz com você”.

Diante disso não nos restava mais que dizer-lhe: “Não há problema ministra; Minha admiração pela senhora continua a mesma.”

Em mais de 25 anos de cerimonial jamais havia passado por um momento destes. De nossa parte, temos a certeza de estar executando, de maneira correta, a missão que nos foi confiada.  A precisão das ações nos auxilia a administrar os acontecimentos sem deixar transparecer quaisquer desagrados.
É nestes momentos que valorizamos ainda mais o trabalho em equipe. Todos estavam firmes e não se abalaram. Um apoiou o outro e juntos vencemos mais um desafio que foi o de administrar o problema com grande inteligência emocional. 

Nas adversidades também crescemos e neste dia a equipe foi perfeita.  Ao término da reunião percebemos que nosso profissionalismo foi absoluto.
A postura do Presidente da entidade também contribuiu para o êxito na administração do problema.

Quando temos credibilidade junto aos nossos chefes tudo se torna mais fácil. Para que essa credibilidade exista, temos que ser profissionais altamente qualificados e equilibrados. 


BdP -  O que é para si mais desafiante nesta área? (ex: organizar eventos com VIP, cortejos, coordenação, saber sobre várias culturas, entre outros)

EU - Cada evento é um evento. Cada um tem sua peculiaridade, sua organização e seu cerimonial. Todos são desafiantes principalmente quando realmente trabalhamos à frente deles e somos nós que organizamos, desenvolvemos e os realizamos. É fácil criticar quando apenas vivenciamos o cerimonial e protocolo ensinando ou prestando consultorias à distância. Quando temos nos “ombros”, ou melhor, no cérebro a total responsabilidade de um evento é que sabemos o que significa de verdade o que é desafiante em cerimonial e protocolo.

Organizar eventos com Vips acaba sendo mais fácil porque cada um conhece sua precedência e não quer ser mais que o outro. O mais difícil é organizar eventos com os que pensam que o são ou têm vontade de ser. Esses sim dão trabalho, pois a vaidade os toma de tal forma que perdem a noção em muitas das suas exigências.

Não existe diferença entre evento grande ou pequeno. Todos têm que ser tratados com o mesmo respeito e profissionalismo. Os mega-eventos apenas precisam de mais infra-estrutura, logística mais aguçada, recursos humanos em maior número e, consequentemente, maiores recursos financeiros.

Saber sobre várias culturas já faz parte do nosso dia a dia, mas nunca conheceremos todas. Cada vez que tenhamos uma nova visita a receber deveremos buscar os conhecimentos exatos sobre a cultura daquele visitante.
O mesmo acontece quando viajamos com nossos chefes a países cujos hábitos são menos próximos aos nossos. É dever do cerimonialista  conhecer não apenas os costumes do país mas também os de suas autoridades.

Os desafios são interessantes. Fazem-nos crescer a cada dia e isso aumenta nosso reconhecimento profissional.

O cerimonial é um elemento que aglutina quesitos indispensáveis à convivência, e assim sendo não pode deixar de estar presente em todos os lugares onde habite o ser humano. Muitas vezes pode parecer-se ao cacto: Tem espinhos, mas também produz belas flores e frutos deliciosos.


Saudações Protocolares, 

Diogo Marques dos Santos

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